Agora que a pretexto da tragédia do Meco, se voltou a falar de praxes e da sua irracionalidade, que é tanto maior quanto menos tradição têm as escolas onde são praticadas, recordo os meus tempos de universidade. Foi em Novembro de 1970 que entrei no IST, e nessa altura as praxes era tradição de Coimbra, não me recordo de em Lisboa haver qualquer desses espectáculos circenses à força, que hoje chamam praxes, nem no Porto, únicos locais onde na altura existiam Universidades. Recordo no entanto o meu primeiro dia do Técnico. A praxe foi uma prova de fogo mas à séria. Já conto.
Cheguei ao IST logo de manhã, e pelas paredes exteriores do Instituto estavam pendurados cartazes que diziam "Abaixo a Repressão", "Abaixo o fascismo", etc, escancarados para o exterior. Estávamos ao que soube depois numa vaga de encerramentos de algumas associações de estudantes, coisa que se fazia sem pré aviso, nem autorização de nenhum tribunal. Entrámos, mas os novatos, após uma ou duas aulas fomos convocados para uma reunião na AEIST, onde vi pela primeira Mariano Gago, presidente da associação de estudantes. Essa reunão visava fazer a "praxe" de informar o "macacal" do que se passava na Universidade de Lisboa. Durante a reunião fomos informados também que a policia de choque tinha cercado o Instituto e exigia que todos os cartazes colocados no exterior fossem retirados, sob pena de invadirem a escola e retirarem pelas suas mãos, e dar umas bastonadas, ou mesmo prender alguns dos "agitadores", isto é, nós caloiros, no primeiro dia de escola. Comentava com os meus botões, "está a começar bem". Braço de ferro, uns não queriam tirar, outros insistiam, e acabaram por encerrar os portões, ninguém entrava nem saía, e lá estávamos nós a ser "praxados" mas o Dux, era o capitão Maltez, temido chefe da Policia de Choque. Chegou o almoço, nada se alterava, a estudantada não cedia, e nós os caloiros cada vez mais à rasca, pois os outros já estavam habituados a estas andanças, a que eu proprio depois me habituei. Tudo terminou com a polícia a arrancar os enormes cartazes, não identificou ninguém, embora tivesse entrado para falar com o director, na altura o Prof Frausto da Silva, e pelas 15horas, levantou o cerco e aí pudemos regressar a casa. A partir daí todos os caloiros fizeram a sua "integração", e eu próprio vi os sinais do que, não desconhecendo, nunca tinha visto ao vivo, o "rosto da repressão" num país autocrático e sem liberdade. Grande praxe, melhor que "rastejar com pedras presas nos pés" ou "passear colheres de pau ridículas". No final não morreu ninguém, e saímos mais conscientes, hoje até se morre e sai-se mais humilhado destas praxes idiotas !!!
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