domingo, 15 de agosto de 2010

O senhor Manel das bombocas

Observar, eis uma excelente ocupação hospitalar. Observar o quê? Desde logo o mais óbvio, o tecto. Depois já conhecemos todas as mossas, riscos, defeitos, cores, traços de sujidade, ou de limpeza mal feita, e observamos outras coisas. Enfermeiros/as, companheiros, visitas, objectos que entram e saem, e as nossas visitas sempre esperadas.
Então observei o meu companheiro nos cuidados intermédios, o senhor Manel, acima de oitenta anos, que ali chegou, ao que foi dito, por ter tido uma síncope, de manhã, enquanto "matava o bicho".
O senhor Manel quase não falava. Apenas dizia "naquero!". Nada queria, nem pequeno almoço, nem almoço nem jantar, lanches ainda menos, e para tratamentos ou medicação era mesmo uma "trabalhera" que as enfermeiras tinham. Sempre o mesmo "naquero, naquero, naquero!!!"
Mas o senhor Manel afinal quereria alguma coisa ?
Entra agora em cena uma segunda personagem, a sobrinha do senhor Manel, e sua única visita, que todos os dias do alto do seu metro e setenta e dos cerca de mais de cento e vinte quilos, vinha carregada de sacos do Modelo, e lhe deixava dezenas de sumos, leites com chocolate, embalagens gigantes de bolacha Maria, quilos de bananas, e outras embalagens de cores garridas, plenas de calorias.
O senhor Manel, perante a impotência das enfermeiras bebia três leites com chocolate seguidos, seis bananas numa manhã, litros de sumos artificiais, e a isto nada dizia "naquero!".
Cereja em cima do bolo, o senhor Manel comeu de seguida uma embalagem de seis bombocas, que o consolaram. E eu a pensar que já não existiam bombocas, para além daquele conjunto musical de duas meninas em muito pouca roupa!!!

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