sexta-feira, 14 de julho de 2017

Poemas quotidianos

Cá está mais um post que nada diz a ninguém tirando ao seu autor, um homem do antigamente, que ainda lê livros velhos, e os compra em alfarrabistas, que ouve CDs, um velho de cabelos brancos, olhar desfocado, algo pitosga, muito agarrado aquelas coisas que naqueles anos faziam a diferença, entre os "aburguesados" de gravata que íam às discotecas e engatavam umas miúdas, e nós "os outros" de barba por fazer, desalinho nas roupas, e cabelo por pentear, andávamos com livros forrados com capas de papel, porque os livros que trazíamos sempre debaixo do braço não se podiam exibir em certos ambientes. Estávamos alguns anos antes do 25, e qualquer gesto podia ser mal interpretado. Nessa altura, 1967,  saiu um livro, ou melhor a reedição de um livro original de 1957, chamado "Poemas Quotidianos", de um autor sem nome, António Reis, que teve grande aceitação neste grupo de gente, nós os barbudos e mal vestidos... Os poemas eram curtos, diretos, melancólicos, escritos por alguém sufocado pelo país de opereta do salazarismo. Foi-me emprestado pela minha amiga da altura, a Graciete, rapariga um pouco mais velha, que andava em Letras, como era natural nas meninas da altura, e também gostava desta poesia desesperada e chã ! Gostei tanto que, não havendo papel para o comprar, e não tendo ainda sido inventada a fotocopiadora, decidi copiá-lo com a minha máquina de escrever Olivetti, pois o livro até era pequeno. Hoje a Graciete é catedrática na Sorbonne, decerto reformada, sob o nome Maria Graciete Besse, nunca mais a vi, o autor deste texto já não tem barba, embora continue a vestir-se mal, António Reis morreu em 1991 sem grande obra publicada para além dos ditos poemas quotidianos, os "aburguesados" tiveram filhos das meninas que engataram nas discotecas, o Salazar caiu da cadeira há 50 anos, e o principal motivo desta crónica que já vai  longa é que o tal livro ensimesmado e carregado de melancolia foi agora reeditado de novo, em 2017, altura em que fazem 50 anos da segunda reedição de 1967, Está na "Tinta da China", custa pouco mais de 12 euros, e eu agora vou poupar os dedos. Leiam, talvez não compreendam !

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