sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Relatório de guerra


Todos temos ouvido falar das perspectivas que se abrem à arte da guerra. Ciber, bio, limpa, suja, etc etc. Eu nos ultimos dias tenho estado a ser vítima de uma das chamadas novas, mas que é bem antiga: a guerra bacteriológica. Foi isso que me afastou ontem do ciber-espaço para as profundezas da almofada. A invasão já começou há alguns dias, tendo os microscópicos batalhões inimigos penetrado por um cateter, e tomado posições.


A reação não se fez esperar. Coração aos pulos, febre alta, defesas para cima deles. O problema é que as defesas eram insuficientes e inadequadas, insuficientes pois o coração está em serviços mínimos, inadequadas por não identificação de quem era o inimigo.


Só na 4ª feira passada, os serviços de espionagem consegiram desmascarar o inimigo, após ter sido aprisionado numa seringa, metido num frasco e feita uma hemocultura. Mas a invasão mantinha-me a febre, e o coração disparava em vão com pistolas de água.


A partir dessa data chegou o novo armamento pronto a ser usado dentro de uns saquinhos transparentes, antibiótico, que passou a ser usado no lugar do anterior. A luta iniciou-se e teve ontem uma fase complexa em que não percebia se ís ganhar ou perder. O dia passou-se com informações contraditórias a chegar à minha almofada (onde se instalou o posto de comando).

A cabeça concentrada na guerra e nas suas possíveis consequências.


Durante a noite aparentementemente o inimigo começou a ceder, e hoje de manhã ainda havia luta. Mas a febre baixa indicava que o essencial das posições tinham sido salvaguardadas.


Vamos agora passar à fase de busca e aniquilação, de posições que possam ter ficado nas mãos inimigas.


Claro que no meio disto não posso actualizar o blog.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

A greve geral é....

Um sucesso garantido, basta que os transportes e as escolas parem e ninguém se movimenta. Um contributo muito pequeno para a perda de produção num país individado, mas é mais uma pedrinha na engrenagem. Totalmente inútil por ser apenas política, exigir mudanças de política, mas como se sabe neste país a política muda-se pelo voto, e o mais certo é dar mais uma mão a um senhor de nome de Pedro Passos Coelho , que talvez faça umas mudançazinhas, mas não as que a CGTP e o PCP gostariam. Interessante porque um dia de descanso é sempre uma boa oportunidade para ir fazer compras de Natal. Os centros comerciais e as grandes superficies agradecem, pois os seus precários nem sonham em aderir. Finalmente, é preferível fazer a greve geral com "toda a tranquilidade" do que andar a partir montras, incendiar carros e destruir património como na Grécia. Assim sendo VIVA A GREVE GERAL !!!!

Oportunistas !!!


Como se aperceberam os meus leitores habituais, não tem sido possível escrever todos os dias, pois fui acometido de um estado febril, que me deixa um tanto ou quanto atarantado. Agora já descobriram a origem. Um ataque oportunista de um ou mesmo de um batalhão de micróbios que normalmente estão na pele, e que através do cateter que tinha na virilha, decidiram penetrar para procurar ali melhores dias. Por isso a febre se prolongava já desde 6ª feira resistindo a outros antibióticos. Só com resultado de hemocultura feita ao cateter entretanto retirado se tiraram as conclusões acertadas.

Entretanto uma notícia que me acalenta: uma rapariga de cerca de 30 anos, também aguardava transplante aqui na mesma unidade e embora estando em pior estado que eu, estava com a mesma prioridade, e não competia comigo por ser de diferente grupo sanguíneo. Pois foi tranplantada ontem. O meu dia também chegará, mas convém que estes ou outros oportunistas não chateiem.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

O tempo e o motivo

Ontem não pude escrever no blog, pois apareceu febre, devido a constipação, ou outra coisa qq. E era um dia em que devia ter escrito algo, pois fez exactamente 2 meses de internamento consecutivo, uma semana em Beja e o restante em S. Marta. Isto quer dizer que chegamos a um ponto em que parece que estar aqui é um objectivo em si mesmo. Começa-se a perder a noção do tempo e do motivo pelo qual se aqui está. O tempo é a simples seqência das noites e dos dias, mais ou menos iguais, e o motivo parece estar a cumprir uma expiação.
Mas felizmente sei que não, sei que vai chegar o dia aprazado, e nesse dia tudo irá correr muito bem.

sábado, 20 de novembro de 2010

Cimeira e cimeiras ...


Um pouco de política aqui não faz mal nenhum, para recordar algumas memórias adormecidas. Sou daqueles que em 1974/5 desfilou muitas vezes sob um enorme cartaz onde se dizia "Nem Nato nem Pacto de Varsóvia, Independencia Nacional". E disso não me arrependo mesmo nada. Manifs na Avenida, concentrações na Praça do Comércio, pichagens, algumas ainda restam nos muros de Lisboa.

Ora as actuais manifestações contra a Nato, uma decorre hoje nada têm a ver com esses tempos.

O Pacto de Varsóvia, desapareceu, e os países da chamada esfera soviética quase todos se acolheram debaixo do guarda chuva da Nato. Agora nada de ilusões, pois a Rússia continua a guardar os seus arsenais, e novos perigos surgem, de carácter mais local, como o Irão, Israel, a China, a democrática Coreia do Norte, o Paquistão, a India, todos detentores de tecnologia nuclear (ou quase), e quem sabe que mais, ou mais global, como o terrorismo islâmico, ou outros, que já mostraram a sua capacidade.

Ainda assim prefiro a Cimeira de Lisboa (não precisavam era de exagerar...) do que as cimeiras a dois contra as quais desfilei quando tinha 22 ou 23 anos.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

A noiva judia


Terminei agora a leitura deste pequeno livro de contos de 1992 de Pedro Paixão. Tratam-se de contos quase poéticos e quase todos eles versando uma das relações mais difíceis e antigas do mundo: a do homem com a mulher. Vou deixar aqui um texto para se ver o tipo de linguagem.



"Deixou só uma rosa que depressa feneceu. Mais não recordo para além de certo movimento desastrado dos corpos e uma estranha secura na boca.

E se mais houvesse não bastaria. A satisfação abre também as suas portas sobre nada. Ficamos quietos e não sabemos. Comemo-nos ns boca e no peito. E por detrás de tudo isto há um fundo que é uma paisagem gelada.

Se mudamos de ideias é porque se vão empurrando, uma a uma, para fora. A casa é estreita. Se não fose o mudares subitamente de cara desistia. Esteja á sua vontade. Pode fazer, minuciosamente e sem pressa tudo o que quiser.

Já reparou certamente que comigo não vai a sítio algum. Nem de passear gosto. Continuo imóvel diante da janela do quarto de minha mãe. E o meu inverno chega-me.

Sabendo com precisão que não ficou nada criamos a ilusão da memória. Para isso servem as rosas. E as horas são todas iguais. Por isso vem sempre que queiras. Se te esperasse não te encontrava. E já houve um mistério nisto tudo que desapareceu. Por isso volta a qualquer hora. A casa estreita ond me deito não é minha. Eu quase gosto dsta vida que tenho.

Não queremos saber do que se passa lá fora. Definitivamente terminaremos. Os braços continuam caídos sobre o tampo da mesa. Mas de quem? As palavras que ouvimos são desfeitas. As palavras sagradas seriam soluços de uma ave pousada na tua cabeça. Mas não existem palavras sagradas, claro. Amanhã recomeçaremos.

Não te esqueças que se uma parte é ilusão a outra é verdade. Foi mesmo ela que te amou. Mas há coisas que se não dizem. Como estas. E, claro está, não vale a pena pensar nisso e não se pode evitar. As coisas inúteis são preciosas para as almas sem sossego como as nossas. É quase belo agora. A noite que caiu guarda tudo nas suas mãos fechadas eo brilho dos teus olhos é o de uma estrela de que não me lembrarei. Dorme agora."


"Carta a José" de Pedro Paixão, do livro "A noiva judia"


Espero que gostem...

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Tudo lhe será retirado ?

Um dos meus gostos preferidos é ouvir música. Pouco a pouco a minha cabeça começa a ter dificuldade em suportar mais do que alguns minutos com o iPod. Lateja e parece que o sentimento de prazer se torna numa pena.
Não é que não continue a vir aquela lágrima insistente quando se inicia a "Milonga del Angel" do Astor Piazzola, ou a alma empolgada com a "Eroica" de Beethoven ou a 25ª sinfonia de Mozart, a pele de galinha do 2ºandamento do Concerto 21 para piano e orquestra de Mozart, ou aquela nostalgia quando ouço o "Cinema Paradiso" pelo Haden e Metheny, tudo isso se mantem, mas é um prazer curto, que rápido cede a uma necessidade de parar.
A minha cabeça é mais forte, mas aqui não para fazer aquilo que mais desejo. Será que apostou em que "tudo lhe será retirado?", ou antes "tudo será posto em suspenso?"
Ela é quem manda e espero que opte pela segunda opção e me devolva tudo o que me quer retirar.

A hospitalite


Há aqui um enfermeiro que, por graça ou a sério, não sei, diz que começo a sofrer de hospitalite. De facto fez ontem 7 semanas que estou aqui em S.Marta, a que podemos somar mais 5 semanas desde Julho em Beja, intercaladas com estadias em casa, quase sempre na cama ou próximo dela, e cada dia a sentir-me pior que no anterior.

Em que consistirá esta perigosa doença? Ninguém me diz, mas deve ser fácil indicar alguns sintomas.

Comecemos primeiro pelo contexto. Espaço confinado a uma cama e a um cadeirão, entre os quais se revezam os movimentos, banhos acompanhados e a acabar com a língua de fora, no mesmo espaço se dorme, se sua, se urina e se fazem fezes, e mesmo ao lado come-se (não tudo ao mesmo tempo bem entendido...), caras iguais que se revezam, comida do melhor restaurante aqui da cave, paredes amarelas tecto branco, luz do dia que apenas se adivinha. Podíamos chamar a isto uma prisão, pois também estou preso à parede por sete fios, que embora frágeis não convém forçar, mas não é...

Assim os sintomas são de claustrofobia, quando temos comida a reacção em vez de fome é de náusea, quando temos sono, a reacção é de "espertina", e só o Lorenin 2,5 nos dá a paz dos anjos, pois de noite levanta-se voo deste local, para nuvens desconhecidas, junto de pessoas conhecidas ou não, que nos fazem esquecer o local. Aterramos, ouvimos os plim plim dos monitores e renova-se a consciência.

Apesar de tudo as noites parecem melhores que os dias. Pelo menos não nos enjoam.

Interrupção

Durante dois dias tive problemas de acesso à internet, que já estão resolvidos. Hoje vou retomar, e acalmar alguns que me seguem que possam pensar que algo de mal tenha acontecido. Não, a esperoterapia continua...

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Medos


Ontem há noite a tensão subiu para 12/7 e as pulsações chegaram a 70. Durante a noite também acordei com 70 pulsações. Para o mais vulgar mortal isto são excelentes resultados, mas para mim é quase hipertensão, e taquicardia, dado que os meus valores de tensão usuais são 9/5 e as pulsações, quando chegam a 50 já é nos melhores dias.

Vem isto a propósito de um dos meus maiores medos, as arritmias. Verdade que tenho um cardiodisfibrilhador implantado, mas como resistirá o meu coração, que está preso num fiozinho, se levar assim um electrochoque de um "porradão" de volts? Será que levanta de novo a cabeça ? Ainda me lembro daquele dia de Julho em que acordei cm 172 pulsações, o que referi num post lá mais para trás.

São alguns medos que não controlo, embora este seja o local onde os riscos que lhe estão associados, podem ser controlados. Esse o antídoto para o medo. Readiquire-se a confiança e até parece que tudo vai bem "no reino da Dinamarca".

domingo, 14 de novembro de 2010

O prazer de pintar


A propósito de um telefonema que recebi ontem da Manuela, a minha mestre da pintura, recordo os prazeres que me têm sido retirados nestes últimos meses, entre eles, o prazer de pintar. De passar as tardes misturando cores, fazendo e corrigindo, outras vezes recuando para outras tonalidades, ou destruindo o já feito; em casa em geral este prazer associava-se ao de ouvir música baixinho, muitas vezes Mozart, muito inspirador !

Claro que espero poder voltar, mas penso que muitos meses ainda faltarão.

Recordo também o prazer das aulas das segundas e quntas, dos colegas talentosos, dando o seu melhor, o enorme talento do Brian, a música do Arnold, o café do Jack, a paciência infindável da Feliciana, o traço brilhante e místico da Anne Carolina (vejam no blog Gota Aurea), os pormenores da Cristinalda, o sorriso da Pamela, a impaciência da Maria José, as pétalas coloridas da Hannia, a June, enfim que me desculpem aqueles de que não referi, pois a minha cabeça também está enfraquecida (ainda ontem não deu para o post).

Sei que alguns me lêm aqui, o que lhes agradeço. É a forma de estar-mos em contacto.

Já agora deixo aqui dedicado a todos um quadro que bem conhecemos. Deve estar na parede da sala pois a ano passado "de castigo" a Manuela fez-nos copiá-lo em colectivo. Para mim até foi um prazer.

sábado, 13 de novembro de 2010

Cansaço

Ontem sexta feira sentia-me particularmene cansado ao longo de todo o dia. E como é normal, quem está cansado descansa... foi o que fiz.
Hoje a coisa parece mais equilibrada, vamos ver se dar para um post.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Desafios de uma vida


Fizeram-me chegar hoje o endereço de um blog que está a ser feito por uma pessoa de Pombal, o Idílio, que se propôs, e está a concretizar uma viagem de bicicleta do Alaska até à Patagónia. A viagem iniciou-se em Julho em Inuvik no Alaska, e neste momento o ciclista solitário acabou de entrar no México pela fonteira de S.Diego, Tijuana.


O tempo que estima para a viagem é de cerca de ano e meio. Entrtetanto vai contando as peripécias da sua aventura, e deixando indicações e fotografias dos locais por onde vai passando.


Daqui da minha cama de hospital de imediato aderi à ideia e vou, enquanto puder, acompanhar o Idílio na sua viagem solitária.


Questão habitual: o que pode levar alguém a abandonar as "obrigações" para se dedicar a tal tarefa. Enriquecer-se, de certeza, mas e como encarará o risco que tal viagem encerra? Passar zonas de perigo, avarias mecânicas, problemas de saúde. Julgo ser a vontade indomável da superação.


Grande exemplo para mim que também vou precisar de superar uma viagem plena de riscos. Sem medos, para lá do horizonte nova estrada vai surgir.


Aqui está o endereço para espreitar http://bacalhaudebicicletacomtodos.blogspot.com/

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Procura-se país em bom estado para transplante urgente


Portugal pediu hoje mais 1250 milhões emprestados... ou como se diz, "vendeu" dívida nos mercados financeiros a um juro inimaginável de 6,8%. O mais interessante é que ao final da tarde esse juro já era de 7,3%. Não percebo nada de finanças, neste momento nem a minha pensão sou capaz de gerir, mas fico com a ideia que uma entidade especuladora que tenha comprado 200 milhões de euros em obrigações às 11 da manhã, e vendido às 6 da tarde, terá ganho em poucas horas 1 milhão de euros sem levantar uma pedra que seja, e contribuído com mais machadadas para a imagem do país. Estou certo ou estou errado?...

Quem dizia que a aprovação do orçamento ía por tudo na ordem, e por isso fizeram um orçamento típico de um "inverno soviético", que vai provocar recessão (só hoje em duas empresas que fecharam foram mais 600 despedidos), terá, em calhando, de responder à seguinte pergunta: querem morrer do mal ou preferem morrer da cura ?

Parece que este país também está a precisar de ser transplantado...

Dependências


Estar dependente, é o que caracteriza o estado em que me encontro, pois para quase tudo preciso de ajuda, para o banho, para ir e vir do cadeirão, para algumas necessidades fisiológicas, para vestir um simples pijama, no limite para ter algum bem estar e alguma actividade, como ler ou escrever, dependo de uma droga que me puxa para cima de nome "dobutamina", assim uma espécie de cocaína, mas em bom...


Outra coisa é "sentir-me dependente". Tem mais a ver com o que vai no meu espírito e na relação que aqueles que me rodeiam estabelecem comigo. Aí, salvo um caso ou outro muito excepcional, de um enfermeiro/a na profissão errada, a generalidade do pessoal tudo faz para esbater este sentimento, tudo fazendo para ajudar mesmo brincando com a situação.


Desta maneira é fácil sentir-mo-nos apoiados e não dependentes.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

A propósito de ostras chegamos à "choucroute"


Cá vai a historieta prometida num post anterior. Em 1993 ou 94, eu e o Luis Mira pertencíamos ao Comité de Direcção da Fábrica de Setúbal da Renault, eu na Qualidade ele no Pessoal. Como acontecia todos os anos, o Comité ía em conjunto a França assistir a um evento do grupo chamado "Forum du Progrés", ou de nome parecido. E lá fomos 7 ou 8 membros, nos quais o Luis era a mais recente aquisição.

Tudo de avião, instalámo-nos num Hotel que creio ter sido o Pyramide na Porte S. Cloud, e toca a ir jantar. Decisão tomada, uma Maison d'Alsace da Boulevard des Capucines. O grande grupo abanca e de imediato se inicia pelas tais ostras francesas (por vezes terão adquirido a nacionalidade no prato), excelentes, das que o Luis diz no seu livro que não lhe passavam pela goela há já algum tempo.

Terminadas as ostras sem restrições passa-se à especialidade da casa, a célebre "choucroute" alsaciana, prato para estômagos fortes, e muito bem servida, uma só travessa para todos que teria mais de um metro de comprimento...

Já tudo saciado para além do razoável para a hora avançada, talvez onze e meia da noite, e regado a boa cerveja, passa-se a sobremesas. Coisas levezinhas para todos, frutinha fatiada ou parecido. Quando chega a vez do Luís pedir a sua, ele, com a maior calma do mundo diz "Para sobremesa quero uma choucroute".... O criado atrapalhado, acabou por constatar que era mesmo a sério, e lá acabou por mandar vir mais uma da cozinha, a qual se preparava para encerrar, que o Luis comeu regalado enquanto nós petiscávamos a frutita e pensávamos como se levantaria na manhã seguinte. Posso garantir que se levantou fresco como uma alface, apesar da ter comido a "choucroute" e ainda não ter dispensado uma sobremesa de verdade.

História de um cateter


Era uma vez um cateter que ontem ainda saía do lado esquerdo do meu pescoço. Coisa muito útil em muitas situações da vida. Por ali se retira sangue ao desgraçado (se as Finanças sabem...), se introduz toda a dose de líquidos, soros, medicamentos, etc.




Entretanto, por já lá se encontrar há algum tempo, decidiram mudar para a veia jugular que está no lado direito do dito pescoço. A colocação é quase uma mini cirurgia, com anestesias, batas verdes, resguardos a tapar o pobre diabo, agulhas, tubos, liquidos de várias cores.


Após tanta preparação, furaram-me ontem o pescoço em dois lados, esgaravataram, empurraram, forçaram, mas o dito cateter recusou todas as demarches e ficou a rir-se do médico, assim como uma vingançazinha, embora seja o paciente quem sofra.




Hoje de manhã decidiram voltar à carga. O mesmo arraial, mas a apção foi colocar na veia fémural, isto é, na virilha direita. Chega-se a vias de facto e o cateter sem qualquer dor, em poucos minutos parece que vai por si para o local desejado e lá ficou sem chatear ninguém. Uma pequena diferença, hoje tratou-se de um médico espanhol, e um internista...

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Crónicas da América


Como prometido, e após ter concluído a leitura do livro do Luis Mira, vou deixar aqui algumas impressões.

Claro, tendo em conta o meu estado actual, a leitura destas crónicas fez-me voar daqui para locais distantes, por alguns momentos a cama, o cadeirão ficou para trás, e a minha mente fixou-se no parabrisas do "pequeno Chevrolet vermelho", a percorrer aquelas estradas intermináveis.

O livro, embora feito para "small circle of friends", apresentou-se-me como uma obra em capítulos, onde as memórias do Luis, a sua investigação prévia, as leituras que faz dos locais, a relação que estabelece com os grandes momentos da História, das grandes recordações de cinéfilo "obsessivo", e de apreciador da música americana, que faz sentido no seu conjunto.

O humor que lhe coloca, a linguagem coloquial, as referencias pessoais de falsa "autocomiseração" deram-me a sensação de que alguém no livro falava comigo.

Para além de um circuito de espaços, música e cinema, temos também um circuito gastronómico que vem a propósito. Assim bebemos com ele o rosé fresco ou o Pinot Noir do FF Coppola, comemos o "Steak and Lobster", comemos no Scomas's, jantamos com o Steinbeck ou petiscamos as ostras com luva de pedreiro (a propósito contarei noutro post uma história que o Luis Mira me vai perdoar). Tudo isto sem pagar um centimo...

Afinal também já fui dos america-cépticos, mas sempre apreciei a forma como a sua arte mais popular é capaz de romper, de se pôr em causa, trazer a lume as causas mais incómodas, e isso agrada-me muito.Não sou cinéfilo, mas gosto de muitos dos filmes que refere, e a música de que fala também me entusiasmou, e ainda hoje me dá gratas recordações.

No entanto não se desculpa, dizer mal do seu próprio clube, o Sporting, usar a palavra "peida" que é deselegante e o pior, não ter incluído um mapa que ajudasse o leitor a seguir o trajecto, por mais sinuoso que fosse, mas isso fica para a segunda edição.

Obrigado Luis por partilhares estas memórias

Precipício

Hoje tive a visita da psicóloga de serviço, no hospital. Gostei da falar com ela, mas levanta-se-me uma questão, como dizer a alguém que está na corda bamba, entre o risco e a salvação, que tem de descartar o risco e valorizar apenas aquela parte da corda à qual se vai poder agarrar para atravessar o precipício?

domingo, 7 de novembro de 2010

Perfeito domingo de manhã em UCIC

Após uma noite mal dormida em que me estavam a asfixiar para me matar, não é que descubro que o meu próprio braço se encarregava da tarefa, sendo assim fácil dominar o inimigo, inicia-se uma manhã que ainda vem escura. Aqui nós esperamos na cama o pequeno almoço, primeiro libertando o cheira que exala do corpo, sacudindo os lençóis várias vezes. Hoje, não havendo rádio com interesse, fui ao computador buscar o podcast do Contraditório de ontem da Antena 1 e copiei para este blog a entrevista do José Gil na totalidade, que não tinha ouvido, podendo assim ouvir quando quiser e partilhar com quem quiser.

O pequeno almoço, ao croissant e meia de leite feita com bica, aparece um surpreendente paposeco de ontem com um pacotnho da prestigiada e intragável Becel.

O banho foi rápido, mas para chegar ao WC é preciso um veículo chamado cadeira de rodas, senão não chego lá, mas a viagem foi rápida e confortavel. Boa ajuda no banho, sentado e ensaboado de desinfectante. No retorno o cansaço já era muito.

E aqui me sentei no chamado "cadeirão", onde me religaram sete fios, cinco de monitorização, um de soro e um da minha "cocaína", chamam-lhe aqui dobutamina, e é ela que me permite ainda ter uma actividade digna de um homo sapiens. Ela está a permitir escrever esta bela mensagem de domingo, e garanto que me vai permitir passar um domingo perfeito, melhor ainda se o Benfica perder no Porto, mas isso nada tem a ver com a dobutamina.

PS: tive de manhã cedo a visita extraordinária da Maria Augusta, que de passagem para o autocarro me veio dar um beijo de despedida.

sábado, 6 de novembro de 2010

Quem espera sempre alcança?


Porquê esta imagem, perguntarão os meus remotos leitores. Todos os dias acordo com um sinal de que um novo dia e uma esperança renasce. Mais quem espera sempre alcança do que que espera desespera. Na realidade a cabeça tem de comandar a vontade do nosso corpo para resistir, não é tudo, mas se a cabeça desiste como fica o resto?

Procuro ocupar a cabeça com diversas ocupações, que variam muito para evitar o cansaço, meu principal problema. Ouço rádio e música, talvez o menos cansativo, alimento um diáro escrito à mão, e este blog, aqui mais dificil, vejo alguma pouca televisão, e procuro ler, embora a leitura me canse bastante.

Vem a propósito pois estou a ler, embora lentamente, um livro escrito pelo meu ex-colega Luis Mira, actual Director de Pessoal da Renault, e que teve a gentileza de me vir entregar pessoalmente ao Hospital com uma dedicatória. São gestos que enobrecem e que outras pessoas ainda não tiveram. Pois o Luis escreveu um livro que é uma crónica pessoal de uma viagem que fez em 2008 pelos States. O livro chama-se "Crónicas da América" e tem o sub-título "Na rota dos grandes espaços da música e do cinema". Uma ideia excelente, de que falarei em breve aqui, de revisitar os grandes espaços relacionados com as nossas memórias de juventude, no que toca as músicos e os filmes que nos apaixonaram.
Está explicada a razão de ser da imagem?

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

O dia começa cedo

Aqui no hospital o dia começa antes das 7h00 da manhã com os primeiros comprimidos e as primeiras avaliações da tensão arterial, bem como retirar dia sim dia não sangue. Isso permite que a partir dessa hora me ligue, em geral á Antena 1 para ouvir notícias e rubricas preferidas, como o Pano para Mangas do João Gobern.
Hoje ouvi uma entrevista com o filósofo José Gil, a qual pode ser ouvida na íntegra neste post em baixo, vale a pena mesmo ouvir, onde ele diz que a crise está a tornar os portugueses mais egoístas e o medo regressa ao ambiente de trabalho das empresas, sobretudo aquelas onde se estão a efectuar reduções de pessoal. Cada um trata de si, a cooperação no trabalho é uma excepção, e a regra é salvar a pele, com consequências a todos os níveis, até na produtividade. Diria que isto não é novidade, nós tendemos para o individualismo, e os hábitos de trabalho em equipa nunca foram muitos fortes.
De resto os dias permanecem iguais só a espera desespera.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Feriado


Hoje é dia feriado, no meu caso dia igual aos outros. A ultrapassar, como nos outros dias as minhas fragilidades, que tornam penoso um simples banho, uma vista de olhos na televisão ou no computador, ler e escrever e sobretudo comer. Esta minha incompatibilidade com as refeições chateia. Olhar para aqueles tabuleiros cheios de arroz de frango ressequido, peixe com cheiro a meses de arca congeladora, ou bifes de peru com textura pré histórica, e não comer, irrita. Vale a fruta que se come. Mas o verdadeiro problema é a ausência de apetite, que me faria rejeitar o mais cheiroso arroz de marisco.