segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Consultas destrutivas

Ainda a propósito de 3ª feira passada numa das consulta a que fui. O homem é um barra, ao que parece é mesmo, mas ao anunciar ao doente uma terapia será melhor assustá-lo com todos os riscos dessa terapia, sem valorizar adequadamente as vantagens, será essa a forma de injectar esperança, será o tal realismo. Pôr em causa a eficácia dos meios que eu, embora com limites do meu real conhecimento, sabia já poderem falhar, não será assustar? Assustar será o mesmo que consciencializar o doente dos riscos que corre? A estratégia do copo meio vazio será a melhor?
Na prática só conseguiu colocar-me rastejando, e só pouco a pouco fui erguendo a cabeça. Porque é que não ensinam a estes super especialistas um pouco mais de humanidade no trato?

domingo, 19 de setembro de 2010

Caminho longo e estreito

Continuando da música para a vida, os Beatles, de que sou incondicional, têm no seu derradeiro LP, o discutido "Let it be", de 1970, uma canção chamada "The long and winding road", estrada longa e sinuosa, referindo o seu percurso até chegar ali, pois nesse ano terminaram a sua curta mas meteórica carreira e esta foi uma das suas últimas músicas.
Para mim vejo um caminho longo sinuoso, e além disso estreito, não para trás deste momento, mas para percorrer a partir de agora, e eu com pouca resistência ao vento. Um dia após outro, passo a passo, hei-de percorrer essa "long and winding road".

Uma força positiva


Já se percebeu que tenho uma grande paixão pela música, e tem sido um forte suporte de momentos mais íntimos em que parece que as coisas desabam. Depois ouvimos e voamos com ela para bem longe e de novo aterramos em campos menos agrestes. Gosto de todo o tipo de música, clássica, jazz, portuguesa, brasileira. Mas nos últimos tempos há um disco que tenho ouvido dezenas de vezes no meu iPod. Trata-se de um disco publicado em 1997, "Beyond the Missouri Sky", e nele participam apenas dois músicos, Charlie Haden no contrabaixo e Pat Metheny na guitarra. Tem também um terceiro instrumento, o silêncio... Raramente uns curtos recortes de orquestra.


E somos projectados para as longas planícies desérticas, os grandes espaços, onde o silêncio nos cala, e nos concentra nos acordes. É tão intimista, que ao ouvi-lo muitas vezes me vêm as lágrimas aos olhos (talvez não devesse confessar...) Não é jazz, mas também não é outra coisa, talvez música de fusão (como muitos detratores dizem para apoucar...), sei que faz voar, e não é "lounge" como hoje se diz, é música mesmo muito boa, muito forte, mas sem se impôr, entranha-se, como dizia Pessoa.


Resta ainda que vi ao vivo ambos os músicos em momentos diferentes. Charlie Haden no célebre Cascais Jazz de 1971 (o primeiro), quando após actuar foi posto na fronteira pela PIDE por dedicar uma das músicas aos movimentos de libertação das, na altura, colónias portuguesas, Pat Metheny, muito mais tarde, num excelente espectáculo no Coliseu de Lisboa. em que a meio, uma jovem espectadora, sentada na borda de um camarote, caiu da altura de 2 ou 3 andares, sobre a plateia. Acabou ferida, e Pat interrompeu o espectáculo e dedicou-lhe uma canção. Recordações que perduram.

Da importância de ser terça feira


Já vou na página 149 do livro "As terças com Morrie", que me foi recomendado e oferecido por pessoa amiga. Este livro, sendo uma lição de vida, é também, para mim, e para o meu estado de saúde, algo dificil de "digerir". A doença, a morte, sendo para mim situações tão íntimas, serão passíveis de ser assim expostas, desta forma tão aberta como qualquer facto da vida ? Dir-me-ão que são factos normais na vida de um ser vivo, estar doente, morrer, e que começam com o nascimento. São caminhos que não se conseguem evitar. Mas fazer deles tese, e sobretudo a exposição da morte, impressiona demais. Talvez seja este o objectivo do professor Morrie, descartar a morte como facto emocional e integrá-la na vida. Este é apenas um primeiro comentário, mais tarde voltarei ao assunto.

sábado, 18 de setembro de 2010

De regresso ao meu aconchego

Depois de uns dias ausente no Algarve volto ao meu aconchego, aqui em Ourique. Como diz a canção de Elba Ramalho
Estou de volta pro meu aconchego
Trazendo na mala bastante saudade
Querendo um sorriso sincero, um abraço
Para aliviar meu cansaço.
Já o tinha referido em outro post. Aqui a sensação se segurança é maior, talvez porque aqui estou debaixo da asa dos três anjos, lá apenas disponho da protecção de um deles.
Volto também ao meu blog onde encontro um comentário ao meu Barnabé que penso estar carregado de sabedoria, não por citar George Bernanos ou Confúcio, mas por ter palavras certeiras como setas. Daquelas que vale a pena ouvir, pois são ditas com a vontade de causar efeito. Obrigado por elas.
Este aconchego também não seria possível sem a Maria Augusta, que tem aturado as minhas crises de pessimismo, e não mostra o seu, procurando por actos contrariar o caminho que nos leva ao chão.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Com falas dessas... que esperanças?

Recordo o velho poema de Sérgio Godinho:

Vieram profetas
Vieram doutores
Santos milagreiros, poetas, cantores
Cada qual com um discurso diferente
P'ra curar a vida da gente
E a gente parada fez orelhas moucas
Que com falas dessas
As esperanças são poucas
Mas quando o Barnabé cá chegou
Toda a gente arribou, toda a gente arribou !
Mas o que é que tem o Barnabé que é diferente dos outros?

Preciso é de um Barnabé...

Vem a propósito da minha ida ontem a Lisboa, e as falas de que é preciso fazer agora, o que já podía ter sido feito, ou de que a partir do momento em que se faça o que já devía ter sido feito, então começaremos a pensar fazer o que deve ser feito, e já podía ter sido começado. Valha-me o Barnabé.... e terei tempo?

(Já agora para quem não sabe a canção é de 1972 e o Barnabé era nem mais nem menos que uma referência ao Prof. Marcelo Caetano que na altura aparecia com a imagem de um salvador).

A dignidade acompanha toda uma vida


Obrigado por todo o apoio, força, preocupação e disponibilidade, e já agora... pela flor.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Um campo inacabado


Feito em Maio ou Junho deste ano, este quadro faz parte de um grupo que quis fazer, mostrando a maravilha dos campos alentejanos na primavera. Entretanto por razões de saúde tive de interromper, mas está quase pronto. Já aqui publiquei dois e este seria o terceiro.

domingo, 12 de setembro de 2010

Uma notícia triste



Hoje de manhã ao ler as notícias na net, soube da morte, hoje, do realizador de cinema francês Claude Chabrol. O nome dirá pouco a muita gente, mas quem é da geração 60/70, este nome diz muito por estar associado à Nouvelle Vague do cinema françês, cinema de que muito gosto, embora pouco a pouco esmagado pelas produções de Holywood. Morreu aos oitenta anos, foi um realizador prolixo, e talvez o mais popular dessa geração. Mestre nos filmes acerca das mulheres, filmou-as talvez como só Truffaut o tenha feito. Relembro o último filme que vi dele, já de 1988, "Un affaire de femmes", onde contava a história de coragem, luta, e frieza, da ultima mulher a ser condenada à guilhotina na França ocupada, em 1943, acusada de fazer abortos, Marie-Luise Giraud. O papel é soberbamente desempenhado por Isabelle Huppert. Vamos rever os seus filmes e saberemos muito mais acerca das mulheres... e do mundo que as rodeia.

Fotos da "vernissage"...


No final houve um "Lagoa de Honra" (versão algarvia do Porto de Honra) e um pequeno lanche.


O Dr Joaquim Cabrita, a Maria Augusta e a Drª Clara Andrade


Chegada do veredor da Cultura do Município de Lagoa Dr Joaquim Cabrita.


Umas palavras simpáticas pela DrªClara, a anfitriã, inauguraram a exposição.



A chegada de convidados o Brad, a Manuela, o Eduardo Luís e as minhas filhas Inês e Joana.

Há um ano atrás...

Faz hoje um ano que foi inaugurada a exposição que fiz na Biblioteca Municipal de Lagoa, a convite da Drª Clara Andrade, e após muito trabalho. Foi para mim algo de inesperado, pois jamais, quando iniciei as aulas de pintura com a Manuela, imaginei que pudesse expôr um ano depois. Foi um dia de muita alegria para mim, e também de alguma coragem, pois as obras em exposição eram de um principiante. Expôr assim a um público aquilo que até aí só nós vimos, é algo que deixa marca.

Houve cerca de 50 pessoas nesse dia, desde familia, amigos, companheiros das aulas, e pessoas que apareceram para ver. Uma Biblioteca, sendo um lugar público, facilita muito. Tive incentivos, desde logo e em primeiro lugar da Maria Augusta, mas também da Clara, e da Manuela que me deu um certo OK de que não a deixaria ficar mal...

Trabalhei imenso entre Julho e Agosto do ano passado, pois necessitava de ter um número mínimo de quadros para expôr, e nos inicios de Setembro, ainda estava a acabar alguns trabalhos. Deu-me um enorme prazer. Os quadros que não se vêm na foto podem ser vistos na etiqueta Quadros da exposição "Lagoa em 12 minutos".

O pessoal da Biblioteca também foi impecável no apoio que deu, desde logo o Miguel, mas também a Maria e a Mena, que se encarregaram de organizar o lanche e tiraram as fotos. O vereador da cultura do Município também esteve presente, o que foi simpático da parte dele.


Foi um dia muito bom, dele guardo as melhores recordações. Obrigado a todos os que tornaram possível este dia.


Embora não se vejam nas fotos, tal como as minhas filhas, o Pedro e a Carla vieram de propósito de Lisboa, e chegaram no fim para estar comigo uns minutos, e a Cláudia sei que esteve algures também a dar força.

What's a perfect day...

sábado, 11 de setembro de 2010

Regresso ao meu Norte... o Baixo Alentejo




Depois de uma breve passagem de uma noite estou de novo em Ourique.




Curioso que aqui parece sentir-se uma outra segurança (qual segurança?) que não senti no Algarve. Lá já me sentia um pouco o "peixe fora de água".




Tratados os assuntos, e depois de ontem ter uma sensação de liberdade, estava um dia bonito, a casa tem um grande relação com o exterior, hoje já passei toda a manhã com pouca vontade de sair da cama, e foi lá que fiquei. Uma estranha sensação de insegurança me invadiu, sem razão aparente. Cumpri o ritual de sábado, que é ouvir na Antena 1 o "Hotel Babilónia", das 10h ao meio dia, com o Pedro Rolo Duarte e o João Gobern, através dos auriculares do telemóvel.


Desta vez não ouve Expresso (para quê, os últimos nem os tenho lido). E já estava desejando voltar à minha janela, o que aconteceu logo depois de almoço e da curta sesta.




Entretanto a Drª Ana, médica de família, e mais que isso amiga, decidiu oferecer-me o livro que me tinha recomendado num dos comentários que fez neste blog, "As Terças com Morrie" de Mitch Albom, e, de óculos novos, grande ajuda, já comecei a ler. É pequeno e vou ler, coisa que há cerca de dois meses não faço, por alguma incapacidade de concentração. Mais tarde falarei dele, conforme a impressão que me provocar.




Este post é desinteressante, eu sei, porque alguém pode perguntar, mas afinal que tenho a ver com isto? Mas sem razão, pois o primeiro destinatário deste blog, nesta fase, é o seu autor.


sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Para Sul


Hoje, desde há cerca de 2 meses, vou de novo regressar ao Algarve, mas o retorno será breve. Vou-me "aventurar" a uma saída mais longa, mudar um pouco de ares, e tratar de uns assuntos pendentes, tudo com calma e sem pressa, que assim tem de ser. Dizem que o sol faz bem a estados menos optimistas, e espero que sim. Nunca há 2 meses, quando vim para o Alentejo, após uma série de episódios, me passou pela cabeça que tanto tempo depois ainda aqui estaria, apanhando pouco sol, sem ver o mar, sem uma saída, até á Biblioteca, sem uma dose de sardinhas assadas e pimentos, uma ou várias. Mas espero que isso volte em breve. Vamos experimentar.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Um triângulo vicioso


Ora imagine-se um triângulo com três vértices, como qualquer vulgar triângulo que uma criança desenha num papel, a pedido da senhora professora...


Em cada vértice vamos colocar uma palavra... No vértice A, a palavra "realismo", ou "percepção da realidade"; no vértice B a palavra "preocupação" e no vértice C a palavra "depressão".


Podemos assim enunciar o seguinte teorema: "Sempre que a nossa percepção da realidade nos gera grande preocupação, estamos em risco de depressão", que pode ser complementado com um outro que nos diz que " O aumento do nível de depressão, pode deturpar o sentido das realidades, induzir mais preocupação que o necessário, e portanto gerar mais depressão".


Vem isto a propósito de uma conversa tida, e dos comentários feitos ao meu post anterior. Naturalmente a associação das duas anteriores expressões, nos leva a um "triangulo vicioso" em que a ansiedade vai subir.


Ou então fiquemos pelos axioma "O realismo é pai da preocupação". Não carece de demonstração. Assim estou na minha janela, aberta para dentro...

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

A depressão


Já tenho ouvido dizer que estou deprimido, com uma depressão, em estado depressivo. Não me parece nada.
Dir-se-á que o deprimido é o último a reconhecer o seu estado, e como os condenados, o facto de não confessar é porque tem algo a esconder, pelo que é culpado. (este era o método usado pela justiça antes de 25 de Abril, e sei lá agora como será...)
Vamos ver numa entidade idónea o que é isso de depressão. Nada como recorrer ao Governo, que afinal é suposto tudo saber, e perguntar. Ouça lá Drª Ana Jorge o que é a depressão? E ela responde aqui. Entre outras coisas que ela lá diz, estão os sintomas da depressão que são:

Os sintomas mais comuns são:

Modificação do apetite (falta ou excesso de apetite);
Perturbações do sono (sonolência ou insónia);
Fadiga, cansaço e perda de energia;
Sentimentos de inutilidade, de falta de confiança e de auto-estima, sentimentos de culpa e sentimento de incapacidade;
Falta ou alterações da concentração;
Preocupação com o sentido da vida e com a morte;
Desinteresse, apatia e tristeza;
Alterações do desejo sexual;
Irritabilidade;
Manifestação de sintomas físicos, como dor muscular, dor abdominal, enjoo.


Agora começo a ficar preocupado. Está lá tudo, ou será que como nos horóscopos, o que se lê aplica~se sempre um bocadinho a cada leitor. Socorro, Drª Ana Jorge, estou DEPRIMIDO !!!

Será que pode fazer alguma coisa por mim, por exemplo não encerrar mais urgências, abrir novas camas em cuidados continuados, não retirar os internamentos ao Centro de Saúde de Ourique. Como já sei a resposta, a depressão só pode mesmo aumentar....

Ainda outro exemplo

E que dizer de um "auxiliar", o João, que além de fazer tudo aquilo que a Maria José faz, talvez com menos perfeição, pois de um homem se trata... mas com a mesma vontade de bem fazer ainda aproveita os tempos livres para tocar num conjunto musical de baile, cujo nome é "Sem limites" . Podem-no ver em actuação, com a sua viola eléctrica, em primeirto plano. E já que o guitarrista Marc Knopfler é o seu ídolo aqui fica uma pequena Banda Sonora, que ele não irá ouvir, mas que vale a pena ouvir.

Profissionalismo

Surge aonde menos se espera, e não está obrigatóriamente associado às "grandes" profissões, nem aos grandes baluartes do conhecimento.


Querem um exemplo mais simples?

Imaginem uma "auxiliar de acção médica" (agora parece chamados de assistentes operacionais, pois ninguém acha bem uma profissão que consista em "auxiliar"), cuja função está no fundo das funções hospitalares, dominadas por médicos, enfermeiras e técnicos, muito cheios de si, para quem estes "auxiliares" são em muitos casos "moços de recados".

Mas imaginem uma chamada Maria José, que quando chega, dá bons dias a todos os doentes, pergunta como passaram a noite (ou o dia, conforma o caso), limpa, lava, retira urinóis, limpa arrastadeiras, leva-as e retira-as aos doentes com rapidez (nada mais aviltante que fazer "as necessidades" deitado na cama, e quanto mais rápido tudo se passar, melhor), ajuda os doentes a limparem-se, limpa bancadas, aprovisiona e arruma os medicamentos, mantém mesas de apoio, monitores, varões das camas impecáveis, apoia as enfermeiras nas lavagens dos doentes, e no fazer das camas, se um doente pede, vai comprar uma garrafa de água ou um jornal, tudo isto e muito mais sempre com... um sorriso na cara.

No fim do dia, ainda se despede de todos os doentes com desejos de melhoras, mas de todos os 14 ou 15 que se encontram nas várias enfermarias do serviço. Talvez por 600 euros líquidos, mais coisa menos coisa, mas para o profissional a verdadeira retribuição é o resultado obtido todos os dias... o resto toca na motivação, mas estes não deixam que esta se imiscue com o que sabem ser o seu papel, e é com alegria que o desempenham pois têm consciência da sua importância para os outros. e por isso para si próprios.
A dona Maria José existe mesmo....

terça-feira, 7 de setembro de 2010

A janela


Agora que estou confinado a um espaço reduzido, por enquanto, da cama saio para o escritório breves minutos, as refeições na cozinha e pouca televisão, sem ler, só escrevendo por aqui, ganha importância a "minha janela".

Não me estou a referir a uma janela física, embora ela exista e até a fotografei, mas a janelas que a mente vai abrindo para as coisas que se passam lá fora, e que nos chegam aqui ao quarto num sussurro mitigado, mas que nos permite ainda assim levantar a cabeça para ouvir que afinal podem ser boas novas, se as alegrias dos outros, fizerem parte das nossas alegrias.

Vem a propósito uma notícia pessoal recente, mas que não é segredo, por isso a ela me refiro. A minha enteada Cláudia, após cerca de 8 anos de trabalho, e no meio dos receios que a conjuntura promete, ou deixa imaginar, foi promovida na empresa dela, a Huf em Tondela, e é agora responsável por uma importante área "fiscal, tesouraria, e gestão financeira". Ela que ainda há pouco sentia insegurança.

Ficou naturalmente radiante, e começou a disparar mails em todas as direcções dando mostra do seu contentamento, e numa altura em que são mais as pessoas maltratadas nas empresas, um reconhecimento puxa o ego para cima.

Boas notícias criam bom "feeling", e vamos desvalorizar as outras, as menos boas.

Juntando também à situação das minha filhas Joana, neste momento enfermeira e já efectiva, e Inês, desde Janeiro num lugar também interessante, Training Manager, na Fujitsu Siemens, deixa a sensação de alívio, quando a crise gera mais más notícias que boas. O Pedro, esse está bem e recomenda-se, sendo um bom esteiro do nosso conforto, apesar de distante, no que aliás todos estão.

Afinal da janela vê-se sol... e já agora parabéns Cláudia, partilho da tua alegria e até me sinto um pouco melhor.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Dignidade

Após exorcizar todos os "diabos" que trouxe de quatro semanas de hospital, julgo que estou prestes a terminar estas chamadas "crónicas hospitalares". Mas há uma que falta, e fui guardando para o fim. A história curta do senhor Inácio (desta vez o nome é verdadeiro).


Quando entrei em Julho na unidade de cuidados intermédios, o senhor Inácio estava duas camas ao lado da minha, com problemas cardíacos, mas sobretudo com graves problemas de pneumologia. Não comia, respirava por um balão de oxigénio, que permanentemente retirava, o que lhe valia repreensões das enfermeiras, " senhor Inácio não tire o oxigénio, olhe que é para seu bem", "senhor Inácio, nós não queremos, mas vamos ter que lhe prender as mãos". Nesse dia em que entrei, de manhã, ao almoço a neta visitou-o, e ainda conseguiu dar-lhe um pouco de canja, e uns grãozitos de arroz.


No dia seguinte, estive parte da manhã com algumas arritmías, e a "conversa" com o senhor Inácio prosseguia no mesmo tom. Até que, por breves minutos, adormeci. Ao acordar, alguma agitação nas enfermeiras, o senhor Inácio tinha morrido.


Ali mesmo ao meu lado, sem um gemido, um grito, ou alguma forma de resistência. Com dignidade como se diz que a morte deve ser encarada. Nunca tinha estado tão perto da morte de alguém, mesmo de um idoso como ele, para quem a vida já pouco teria a dar. Veio uma padiola e levou-o, a esposa velhinha chorou baixinho, ali ao pé.


Descanse em paz senhor Inácio. Já mais ninguém lhe vai prender as mãos.

domingo, 5 de setembro de 2010

Os anjos da guarda


Dizer que acredito em anjos, com asinhas, esvoaçando à nossa volta, não, não acredito. Mas que os há, há !!! Pessoas que nos rodeiam e nos protegem, como se de anjos da guarda se tratassem, e procurassem encaminhar, proteger, afastar algo de mal que possa acontecer. Queria salientar três.

A minha mulher Maria Augusta, que nestes tempos conturbados que tenho passado, de dúvidas que também a afectam, talvez até mais do que a mim, pois tenho um sentimento mais real do problema que trago comigo, tem sido de uma dedicação total. Eu sei que faz muitas coisas que não seria o que escolheria para si, apenas para me proteger, velar e manter com zelo a minha auto-estima. Longe de ter asas, este anjo da guarda é eficaz, sabe aproximar-se, mas também afastar-se, para manter a sua mente fria, de maneira a poder continuar a ajudar. Dificil é retribuir, como será sempre para os outros anjos, quando apenas tem para se dar um olhar triste.

Segundo anjo, a Drª Ana Monsanto, que me tem acompanhado, para além de uma normal médica de família, é uma pessoa amiga, para quem um telefonema basta, para que se disponibilize a trazer-me a sua palavra, sempre de quem já me viu em melhores dias, e procura que acredite no retorno desses dias, é também um pouco "psicóloga", sendo também para a Maria Augusta um grande incentivo.

Terceiro anjo, e não menor, a Drª Maria José Duarte, que tudo tem feito para encontrar caminhos, abrir portas, quando precisam de ser abertas, para quem um telefonema pode trazer um alento, uma esperança. A Maria Augusta diz que quando a vejo fico logo melhor, talvez pela segurança e tranquilidade que transmite, pela calma que me imprime, é uma pessoa que tem sempre uma solução a propor, mesmo que seja abrir uma porta noutro local.

Para mim, que confesso, não tinha os médicos no primeiro lugar da minha lista, encontrar estas pessoas, e ainda por cima no Serviço Nacional de Saúde, mudou em muito a minha opinião. E estão de fora outros que pela competência permitem que viva uma vida até certo ponto normal, fora as evoluções mais recentes.

Estes são os anjos que conheço, sem asas nem penas, mas com muita capacidade de voo.

sábado, 4 de setembro de 2010

Uma vida a prazo

Segundo uma entrevista dada pelo Dr Michel Komadja, Presidente da Sociedade Europeia de Cardiologia à revista Visão de ontem, "metade dos insuficientes cardíacos morre ao fim dos quatro anos de doença".
Dado que eu sou insuficiente cardíaco, e grave, há cerca de quatro anos, esta notícia não é muito animadora. Duas maneiras de ver, copo meio vazio, já devo a alma ao criador, e posso garantir que não lhe faltaram oportunidades de ma levar para a sua divina presença. Copo meio cheio, se isso não aconteceu é porque ainda há um desígnio que falta cumprir, estou bem medicado e protegido com o meu CDI, o que tem impedido esses desígnios e continuará a impedir.
No entanto, qualquer que seja a posição do copo, qualquer miúdo apenas com aritmética básica responderá ao seguinte problema: "Se 50% morrem até aos 4 anos, quantos ficam depois dos 8 anos?" responde o menino "Nenhum, senhor professor!!!"
Esta a parte assustadora e não permite visões optimistas, a menos que...
Aí abrem-se as janelas: uma nova molécula, a ivabradina, promete dar mais 26% de vida, aí já os 8 anos passam para 10, ou um transplante cardíaco, que te põem como novo, mas para o qual 31% dos transplantados morre, em Portugal, ao fim de um ano. Claro, para quem está a ultrapassar um risco de morte de 50%, passar para 31% seria interessante.
São equações na cabeça de quem passa boa parte do dia a moer com a sua insuficiência.
É suficiente para já...

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Banda Sonora

Três anos de saudade de Luciano Pavarotti. Faleceu em Modena faz hoje exactamente três anos. Ficámos sem o cantor lírico global, o homem ecléctico, o génio, o homem de causas, seja aquilo que se pense de outros aspectos da sua vida. Para ilustrar o seu espírito aberto e empenhamento fica aqui talvez a mais improvável das suas participações. Emociona-me particularmente quando a voz poderosa de Pavarotti canta

"Dici che il fiume
trova la via al mare
E come il fiume
giungerai a me
Oltre i confini
e le terre assetate
Dici che come fiume
come fiume
L'amore giunger
L'amore
E non so pi pregare
E nell'amore non so pi sperare
E quell'amore non so pi aspettare"

enquanto no desfile é mostrada a faixa "não deixem que eles nos matem"; infelizmente para a maioria o apelo não surtiu efeito e nós deixá-mos que morressem às mãos da barbárie.

Sono


Uma das minhas visitas no hospital foi a minha médica de família a Drª Ana Monsanto, de Ourique, foi aliás ela que me levou de prenda o material para fazer os bonequitos que antes apresentei. Durante uma das suas visitas, na unidade de cuidados intermédios aconteceu algo de insólito. Quando ela se prestava a pedir licença para entrar, seriam seis da tarde, a enfermeira que tomava conta da unidade, uma senhora que creio já estar um pouco cansada de enfermagem, dormia a sono solto, junto dos monitores que acompanham os doentes. Então, pé ante pé, não fosse interromper o merecido sono, entrou, esteve uns minutos comigo, voltou a sair sem interromper o descanso da senhora. Mais tarde lá acordou estremunhada com o ruído de algum alarme. Será que não se pode baixar o som destes alarmes ?

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Banda Sonora

Um dos temas que mais ouvi durante estas estadias hospitalares. "Time for love", do disco "Nocturno" de Bernardo Sasseti. Escutem e vejam se não nos tranquiliza.

As trocas

Da minha cama prestava atenção a tudo o que se passava, via entrar e sair pessoas, pessoal de enfermagem a falar em voz alta, auxiliares a discutir futebol, médicos mais raramente, conversas entre doentes, sons no corredor, a luz das janelas, o ruído do ar condicionado, o toque de um telemóvel de uma enfermeira, atrás da qual um grande dístico vermelho indica "Proibido o uso de telemóvel", ou conversas em altos gritos no corredor, junto da placa que pede "Silêncio".
Mas o ponto comum de todas as conversas de enfermeiras e auxiliares é o mesmo: as trocas.
Fala-se de trocas todo o dia. Vou trocar com a Ana a noite, pois a Manela já disse que podia fazer a manhã, assim eu fico com dois dias, dava-me jeito fazer a tarde e a noite, mas a Joaquina não pode trocar, porque tem de pagar a troca que deve ao Zé Carlos, mas vou ver com a Dulce que vem trocar com a Maria, se não se importa, porque para ela também era bom pois está a fazer noite e assim pode juntar com a manhã e ter os dois dias, etc,etc,etc...
Dado que ninguém faz o turno que verdadeiramente lhe pertence, um dia qualquer todos se esquecem do turno que vêm fazer, pois pensam que já o trocaram com alguém, e chega-se a uma manhã em que ninguém vem trabalhar. Paciência, cuidam os doentes uns dos outros, pois de observar as enfermeiras já conseguimos aprender o essencial dos cuidados de saúde...

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

As visitas


Outra das instituições hospitalares que mais confortam quem passa o dia a olhar para o tecto: as visitas. Esperamos ansiosamente as horas passar, a ver se aparece alguém que nos ajude a sentir que estamos ligados ao mundo lá fora (claro, há o telemóvel, mas não é a mesma coisa).

Desta vez tive visitas da Maria Augusta, permanente, das minhas filhas e mãe, do Pedro, Carla e netas, da Céu, e até a minha médica de família me visitou duas vezes.


Como todos têm visitas por vezes é uma algazarra que incomóda. Ainda por cima aqui no Alentejo as pessoas são muito solidárias o que leva a atitudes simpáticas mas cansativas para os doentes.


Na minha enfermaria estava o senhor Hipólito, de Vila Nova de S.Bento, uma jóia de idoso, a tratar um problema cardíaco. As pessoas da Vila Nova, vinham todos os dias em "excursão", na carrinha da Junta de Freguesia, ou na "carrêra", os que sobravam, e constituíam um "cordão" de dezenas de pessoas que começavam no primeiro andar e acabavam no sexto, todos em simultâneo a visitar amigos, vizinhos, parentes lá de Vila Nova, ou de outros locais, num verdadeiro desfile. Assim o senhor Hipólito todos os dias tinha dezenas de visitas, dificeis de controlar pela segurança, pois cada pessoa com um cartão visita o hospital todo.


Bendita solidariedade alentejana... mas às vezes incomoda.

De volta ao senhor Jerónimo


Fazer uns bonequitos foi uma das ocupações hospitalares, deste vosso amigo. Fica aqui o senhor Jerónimo a tratar de uns problemas com o contabilista, enquanto come uma banana, e leva uma "litrada" de soro. Deste não se vende na sua carrinha.