terça-feira, 11 de março de 2014

O meu 25 de Abril (15)

De certa forma passou-me ao lado um dos acontecimentos mais marcantes de 1969 na luta contra a ditadura. Eu estava no Liceu de Oeiras, e o impacto que esses acontecimentos tinham na comunicação social era o minimo possível e sempre manipulado e reduzindo tudo a uma luta entre os agitadores e as autoridades que só queriam preservar o bem estar público. Claro que ninguém acreditava nessa patranha. Tinha ainda 16 anos, e tudo o que acompanhei foi pela imprensa, nomeadamente a mais livre, que eu já consumia. Falo daquilo que ficou conhecido pela Crise Académica de 1969 e passou-se em Coimbra, na Universidade mais antiga e tradicional do país. A crise veio na sequência de acontecimentos anteriores em que durante vários anos a Associação de Estudantes tinha sido gerida por uma Comissão Administartiva, e tinha acabado de haver eleições, após anos havia uma direcção eleita, vários professores e alunos tinham sido expulsos pelas suas opções políticas. Foi neste contexto que a Direcção da Associação de Estudantes, que representava os milhares de alunos da Universidade, foi convidada para a inauguração do edifício de Matemáticas, tendo manifestado interesse em falar na cerimónia de inauguração, pedido que foi recusado, pois iria estar presente o senhor Presidente da República, mais alto magistrado da nação, e os ministros da Educação e Obras Públicas. A inauguração ía ser a 17 de Abril de 1969. Do que se passou daí até Julho hoje conhecemos quase tudo, desde a interrupção da cerimónia, com o pedido da palavra pelo Presidente da Associação, a sua recusa, a saída intempestiva das autoridades, a inauguração feita apenas pelos estudantes, as manifestações e a repressão que se seguiu, a greve aos exames, com Coimbra ocupada pelas forças da "ordem", como se fosse uma zona de guerra, e culminou com a grande manifestação na final da Taça de Portugal de futebol de 1969, em que jogou a Académica, e que foi das únicas que não foram transmitidas em directo pela TV, e que não contou com a presença de qualquer autoruidade. A ditadura era capaz de tudo para calar a voz das pessoas, e quando não o conseguia fazer, fazia tudo para que o país nada soubesse, e deixava os portugueses que protestavam a falar sozinhos, ao que se seguia a repressão, com prisões e outras "meiguices". A nada disto assisti, em nada participei e o que sei só soube mais tarde. Verdade é que a ditadura conseguia mesmo abafar o eco dos protestos, mas muitos já tinham percebido que os estudantes não eram apenas um grupo de agitadores. Aqui podem ver uma excelente reportagem de fotos obtidas por alunos dos acontecimentos de Coimbra. Vale a pena dar uma vista de olhos. O meu 25 de Abril estava a ser cada vez mais necessário. Os estudantes envolvidos ou foram suspensos, expulsos, ou incorporados à força no serviço militar.

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