sexta-feira, 21 de março de 2014

O meu 25 de Abril (25)

Retomo estas crónicas "pessoais e transmissíveis" do meu 25 de Abril com um dos seus pontos altos, foi o fim de semana que mudou muito na minha ainda curta vida. Fim de semana de 21 e 22 de Novembro de 1971. E o evento chamou-se Cascais Jazz, na sua primeira edição. Sobre este fim de semana muito haveria a dizer e muito está dito em muitos artigos e publicações, por isso tentarei fazer o que tenho feito nestes post, sair do óbvio que toda a gente lerá nos multiplos documentos e mostrar o lado pessoal, a minha vivência do que aconteceu.

Porque chegámos lá ? Bom, alguns meses antes tinha comprado na Feira da Ladra um LP de Charlie Parker e outro de um baterista cujo nome não me recordo (já me lembrei, Max Roach...). Foi o primeiro contacto com este estilo de música, que na altura estranhei, pois os meus ouvidos ainda estavam no rock e pop. Havia os "5 minutos de jazz", que ouvia por vezes, e havia a curiosidade que esta música e seus executantes me provocavam. Daí quando anunciado este festival, coisa quase impossivel no Portugal daqueles anos, dissemos que tinhamos de ir. Havia alguns amigos interessados que me dispenso de citar, mas seriamos uns 5 ou 6. Alguns nomes não nos eram estranhos caso de Miles Davis, ou Ornette.

Como chegámos lá ?  Morávamos na margem sul, no Monte da Caparica, e o festival iniciava-se pelas 21h30, pelo que saímos da casa pelas 5 da tarde, apesar do nosso programa não ser bem visto pelos pais, meus e do meu amigo e vizinho, lá fomos de saco às costas, pois teríamos 2 dias pela frente, em que não viriamos a casa, hoje tudo normal, mas na altura nada era assim . Após muitas explicações lá fomos para o primeiro festival de jazz que se realizava em  Portugal. Quatro meses antes tinha havido Vilar de MOuros, mas nóa não tinhamos ido, o dinheiro não chegava.  De autocarro, barco, e junto do Cais de Sodré apanhámos uma boleia para Cascais, pois tinhamos entretanto encontrado os restantes amigos. Pelas 20h, já estavamos lá à porta.

Como era o local ? O Pavilhão do Dramático de Cascais estava ainda em construção, e estava a ser concluido à pressa para o Festival. Ele tinha sido projectado para uma Universíada que acabou por nunca se realizar por razões óbvias. A poeira era imensa, o cimento estava por todo o lado, o desconforto era total, e o pavilhão ainda precisava de muito para ser terminado. Após algum tempo, fomos procurando a entrada, que se fez directamente para a bancada, e fomos procurar um local onde se pudesse dormir por ali, nas reentrâncias do pavilhão. Este festival tinha ainda uma outra estreia no horizonte que afinal, e ainda bem, nunca se concretizou. A possibilidade de experimentar uns "fumos" que ficou adiada "sine die", por falta de "produto".

Assim entrámos num pavilhão poeirento, o ar pouco respirável, um palco improvisado, carregado de equipamento, e instalámo-nos nas bancadas onde os últimos assentamentos de laje ainda estavam visiveis e o cimento mal secara. Nem sei quando custou a entrada, mas penso que os dois dias foram 40 escudos, coisa a confirmar. Em frente da nossa bancada o palco ocupava toda a bancada em frente, e uma faixa anunciava as datas do festival, o local, e a frase que publicitava o festival, "Jazz é cultura". E era mesmo e que cultura de vida para os meus 19 anos, quinze dias antes tinha entrado no IST e aquela praxe de que já falei tinha-me ensinado, se não sabia já, como as coisas eram neste país. Mas estava longe de pressentir o que se iria passar quando começasse a "função".

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